Quando fazia a busca na NET do que havia sobre o Instituto Vaz Serra, deparei-me com isto e pergunto se algum de vocês conheceu e se lembra do professor de matemática Adelino Torres? Será este que de facto andou por lá pouco tempo?
PREÂMBULO
ao livro de Sócrates Dáskalos:
Um testemunho para a História de Angola
Do Huambo ao Huambo
por Adelino Torres
Excerto
“Tal como a memória individual, também a memória colectiva
possui uma estrutura narrativa: somos o que fizemos e nos
aconteceu. Sendo assim, convirá então que se actualize a
tradição dentro do molde narrativo no qual a recebemos, sob
pena de, esquecendo o que fomos, perdermos a ideia de quem
somos”.
M. Fátima Bonifácio, Apologia da História Política, Lisboa,
1999.
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Mas esta história não acabou aqui. Quando fui buscar o diploma do curso verificou-se que faltava a nota, no livro respectivo, de Física Matemática! O que me valeu é que os funcionários da secretaria já conheciam as distracções do Gajean, e deviam ser meus correligionários políticos, pois me entregaram os livros da secretaria (secretos e inamovíveis) para eu os levar a casa do Gajean e sacar a nota. Este recebeu-me como se eu já fosse doutor, perguntou-me outra vez quanto eu queria, e registou a nota nos livros!
Em seguida casei-me e como me faltasse o relatório de Astronomia, frequentei o observatório astronómico durante dois anos, findos os quais fui acabar o relatório em Cernache do Bonjardim, onde trabalhei no Instituto Vaz Serra como professor de Matemática. O seu director era o Gil Marçal, democrata e ferrenho oposicionista. Um belo dia fui a Coimbra visitar o Lúcio Lara e, no regresso, deixei por lapso numa das secretárias do colégio, três obras de Marx e Engels. O Gil Marçal encontrou esses livros mais do que peçonhentos, (era o suficiente para ir passar uns tempos em Caxias), entregou-mos em segredo, e no fim do ano lectivo, apesar dos muito bons resultados alcançados pelos meus alunos nos exames oficiais, libertou-se deste político que poderia causar-lhe alguns dissabores de maneira muito pouco democrática.
Foi então que fui para Lisboa pensando num emprego no Ultramar, de preferência fora de Angola para fugir às perseguições políticas. A barragem do Limpopo, em Moçambique, ia ser iniciada no conjunto da Cabora Bassa e, graças à intervenção do Dr. Madeira do Observatório Astronómico da Ajuda, estava prestes a ser contratado para o Limpopo quando surgiu a indispensável informação da PIDE que narrava que “eu era um membro activo do MUD, com ligações comunistas”.
O Dr. Madeira ficou desolado porque nunca tinha pensado que eu pudesse usar fraldas vermelhas e então eu pensei em aproveitar uma vaga no liceu de Macau, o que não foi avante porque minha mulher julgava que o meu objectivo principal era conhecer as chinezinhas!
Resolvi voltar para Angola mesmo sem aquele emprego que todos os recém formados desejam quando são engenheiros ou doutores.
Casado e com um filho recém nascido eu ia embarcar numa 3ª classe do novo paquete “Uije” o que contrariava grandemente os pergaminhos da minha sogra e a desgostava por ver a filha casada com um engenheiro pobretão e sem emprego.
Fonte: www.adelinotorres.com/trabalhos/prefacio_socrates_daskalos.pdf
Nota de rodapé: (cito de Adelino Torres) “O Gil Marçal encontrou esses livros mais do que peçonhentos, (era o suficiente para ir passar uns tempos em Caxias), entregou-mos em segredo, e no fim do ano lectivo, apesar dos muito bons resultados alcançados pelos meus alunos nos exames oficiais, libertou-se deste político que poderia causar-lhe alguns dissabores de maneira muito pouco democrática.”
Obviamente, este professor não conheceu bem o Dr. Gil Marçal que, por um lado diz ter sido um democrata e ferrenho oposicionista e , por outro, acusa de antidemocrático. O Dr. Gil Marçal era um democrata dos quatro costados e isso valeu-lhe a ele ter sido afastado do IVS. Fazer acusações destas e publicá-las na NET quando o Dr. Marçal já não está entre nós para se defender diz tudo do professor Torres.
Fica aqui registado o meu protesto!
2 comentários:
Na verdade deve ser este Professor que lá andou. Li esta mesma história há algum tempo, se calhar aqui pela Net.
A história dos livros esquecidos em cima da secretária é verdadeira e o seu afastamento, no final do ano também Isso eu lembro-me de ler algures.
Que a história é verdadeira, é.
O que não acredito é que ninguém mais que o Dr. Gil tenha visto os livros e denunciado aos Vaz Serras. Terão sido os Vaz Serras quem instruiu o Dr. Gil a afastar o professor Torres. Nem o Dr. Gil, nem o teu pai, verdadeiros democratas, o teriam feito se mais ninguém soubesse. Teriam avisado o senhor para não deixar livros daqueles em cima das mesas. À época, não foi muito inteligente da parte dele. Karl Marx e Engels não eram exactamente os autores preferidos de Salazar...
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