quarta-feira, 5 de maio de 2010

António Memdes Nunos no I


ESPECIALISTA HISTÓRIAS DE LISBOA

Desgraçada lotaria

por António Mendes Nunes, Publicado em 05 de Maio de 2010  |  

CONTA-SE QUE HÁ uns 50 anos um carpinteiro de Lisboa teria comprado um bilhete de lotaria, que teria colado na porta da oficina, para não o perder. O bilhete terá sido premiado e o nosso homem levou a porta às costas à Santa Casa para receber o prémio. Encontrámos uma história parecida, mas com um final diferente e mais velha século e meio, no "Almocreve de Petas ou Moral Disfarçada, para Correcção das Miudezas da Vida", de José Daniel Rodrigues da Costa, de que temos uma edição dada à estampa em Lisboa em 1819.

Conta o "Almocreve", em nota de 25 de Fevereiro de 1798, intitulada "Cunhal das Bolas", que certo morador do Bairro Alto a quem tinham roubado um bilhete colou outro em que investiu na cabeceira da cama com eficaz cola de marceneiro. Saíram-lhe 300 mil réis (uma soma considerável) e o nosso lisboeta chamou um galego para lhe levar a cama à Santa Casa. Quando passava na Travessa da Queimada uma criada atirou com uma vasilha de despejos para a rua que foi acertar no galego e na carga que levava às costas. O homem desequilibrou-se e caiu no lamaçal em que a chuva tinha transformado a rua. O premiado, que seguia atrás, foi a correr tentar salvar o seu rico bilhete, que mal se via coberto de porcaria. Com a ponta do capote tentou lavar a nojeira em que aquilo tudo se tornara. A tábua da cama ficou limpa, mas o bilhete desapareceu, desfeito numa pasta escorregadia e acastanhada. O mais certo é não ter voltado a jogar, mas isso não nos diz o "Almocreve".

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