Conto da autoria do antigo aluno João Facha
Eram mais ou menos 5 da manhã e, nós lá íamos…….
A promessa que já levava alguns meses a ser cumprida, estava agora em marcha.
Íamos aos patos!
Com lama!
Com mosquitos!
Com frio!
Sem o pequeno-almoço do costume, mas, lá íamos!
O carro, coitado dele, lá ia chiando a cada buraco, seria estrada, não parecia mesmo, mas sempre íamos em frente.
Cá por dentro ia rindo, o Manel (primo) agarrado ao volante ia “fintando” as covas.
O Rui, a seu lado olhava, segundo a segundo o relógio e só dizia, “Bolas, é tarde!!! A estas horas já todos os patos estão no Mar!
A meu lado o Pai sorria, com calma, feliz com o ambiente e, com o facto de eu ir ali, encostada ao seu ombro, de olhos fechados como que a dormir com os anjos.
Facto é que, afinal todas as promessas de me levar aos patos estavam em marcha, cumpriam-se.
Na véspera achei graça…. Tantos cuidados…. O farnel, o fogareiro, o sumo, o banco, as botas, até o creme anti-mosquito e, foi por pouco que a espingarda não ficou no seu armário, tal era a preocupação para que nada “ME” faltasse.
Mesmo agora, de olhos fechados, encostada a esta mesa que viu e sentiu já tanta coisa, não consigo (nem quero) esquecer nenhum momento!!!!
Ana! Ana! Acorda filha, chegámos! Ouvi meia estremunhada.
Cá fora era a grande bagunça!
Madrugada alta, frio, pouco vento, mas uma aragem que fazia alguns arrepios, e me fazia lembrar o doce aconchego do “edredon”.
Negaças, botas, camisolas, casacos, gorros, bolsas de espingardas e, palavras soltas, “vento”, “Gordo”, “horas”, “café” e patos, “colhereiros”, “marrecos”,”reais” tudo seguido, no meio indescritível da arrumação à “Homem”, ou seja: tudo ao molho, e Fé em Deus!!!
Dei por mim com uma sanduíche de presunto numa mão, um copo de café pingado na outra, e um saco aos pés!
“Come depressa e não te afastes, é escuro, não te aleijes…. Estás a gostar?.....
Agora, só agora, dei por isso, e já lá vão uns tempos, de facto, estava a gostar…!
Eu fico na minha “murraça” adiantou o Rui, tenho fé que ainda tenha ficado para trás alguma ‘marreca’!
O Manel seguiu pela vereda mas sempre disse, “vão vocês lá para baixo, é mais fácil para a miúda, e há menos mosquitos, eu vou para o ‘esteiro’”.
Ainda não tínhamos arrumado as coisas, e dois tiros quase seguidos foram disparados pelo Rui.
Depois, foi a vez do Manel que saudou o nascer do dia com três tiros rápidos. E, nós só mosquitos…
Mais tiros do Rui e um pato todo ‘embrulhado’ caiu na margem… logo depois outro, e nós mais mosquitos, só mosquitos!
São agora nove e meia da manhã e o meu pai calmamente diz: “mais meia hora e, ala que se faz tarde!...”
Foi a frase mágica, olhei para ele e ao baixar os olhos para a água vi-os, eram três, vinham rente à superfície e direitos a nós…”Pai, olha à direita”, rápido saíram dois tiros e, ainda, um terceiro. Já em pé e a correr vi que dois patos já nós tínhamos!
Por minutos voltou a calma, mas logo depois um grande bando vinha na mesma rota, nova chamada de atenção ao meu pai, mas ele já os vira e da espingarda que eu tantas vezes vi em repouso, saíram três tiros…, rápidos… seguidos, e que derrubaram três ‘marrecos’.
Depois deste alvoroço seguiu-se outra acalmia, o Sol entretanto já nascido, estava alto embora o frio ainda fosse muito.
A caçada, a tal caçada prometida tinha acontecido, agora era o regresso, primeiro ao carro onde os resultados foram largamente comentados.
Eu toda contente, mostrava ao Manel os ‘nossos’ troféus, e arreliava-o pois ele só tinha um, e era mais pequeno. O Rui, com dois patos, alinhava na brincadeira, e voltava a barafustar com as horas, desta vez era o almoço que foi comido num restaurante à beira da estrada.
Nestas coisas, o regresso nunca tem história e, se este teve, eu não a posso contar porque, agora sim, aproveitei o balanço do carro e o ombro do meu pai e dormi todo o caminho.
Agora, que estão postas no papel estas linhas, e que já cheira a primavera, dou por mim a pensar:
-- Quando é que começa a nova época de caça?
-- Serão saudades?
Convites, esses já tenho!!!
2 comentários:
Gostei, João. Parabéns e obrigado. Abração Sérgio
João Gostei muito. Fez-me lembrar o meu pai e algumas vezes que fui com ele a servir de cão.
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