domingo, 27 de setembro de 2009

Aqui vai mais uma pequena história das minhas

As cegonhas

Que seria da humanidade sem um pouco de fantasia ?

Quando somos pequenos e lemos as velhinhas histórias de animais que falam e têm emoções ou ainda lendas de castelos encantados, a imaginação funciona como se de verdade se tratasse.

É o que se passa, por exemplo, com as manchas da lua. Será que é mesmo a cara de um homem com um molho de silvas às costas, porque as cortou num Domingo ?

Conheço um homem que ao Domingo não pega sequer numa forquilha. Tem medo de, quando morrer, ir parar direitinho à lua ou a um outro sitio assim, esquisito.

A minha imaginação, está ligada às cegonhas. Sempre foram transportadoras de bébés.

Poi é. As cegonhas transportam os bébés numa fralda pendurada no bico. Cruzam mares e florestas vindas não se sabe de onde e pousam suavemente numa qualquer chaminé que emerge de um qualquer telhado.

Um pássaro grande, com asas enormes, abertas, bico grande e aguçado.

De onde vem toda esta fantasia ?

É o que noutros tempos ensinavam às crianças pequenas. A imagem nunca se desvaneceu por completo. Quando era pequena os bébés vinham no bico da cegonha, de dentro de uma couve ou apareciam num cestinho debaixo da nespereira.

Atempadamente vim a saber que a realidade não é esta mas, dentro da minha cabeça a fantasia continua.

Hoje tenho três filhos e uma neta que evidentemente não apareceram em qualquer destas circunstâncias ......

É tão bom termos as nossas fantasias. Fantasias destas ....Mal de quem não tem a felicidade de sonhar A vida é tão dura. Somos azedos, temos invejas uns dos outros, somos indiferentes à beleza dos campos, dos animais, das flores. Romantismo a mais ? Não ! Apenas pondo a imaginação a funcionar e olhando a maravilha de tudo o que nos rodeia.

As crianças hoje sabem tudo. Ainda bem ! A televisão tem sido um bom veículo de ensinamentos. Já não há a inocência de outrora. Tudo era tabú. Tudo era ignorado. Até as coisas mais simples, insignificantes. Quando por nós próprios descobriamos, que desilusão ! .....

Não me lembro quando, ou como descobri a forma como os bébés são feitos ou como nascem. Vinham no bico da cegonha. Pronto !

Qualquer pergunta sobre assuntos “proíbidos” era respondida com um azedo: “ Não sei . Logo saberás. Não é para a tua idade”.

Como não havia outra informação que a da rua, era aí que se descobriam muitas respostas que hoje são respondidas de uma forma séria e até científica.

Quando pelas primeiras vezes atravessei os Campos do Mondego e comecei a ver cegonhas, a minha cabeça povoou-se de imagens da minha infância, longínqua.

Lembro-me de ver a minha mãe com uma enorme barriga. Ia ter um irmão ou uma irmã. Só isso ! Nunca ninguém me explicou porque é que a barriga crescia e como. Um dia, frio de Novembro, levaram-me para casa da minha avó, onde, na verdade, sempre dormi. Mas naquele dia fui antes de jantar, portanto, mais cedo.

A hora, a mim, tanto me fazia. Afinal era ali que dormia sempre .... As horas .... Essas .... Era-me indiferente. Devia eu ter uns cinco anitos. A minha mãe com a sua grande barriga, contorcia-se com dores. Explicação ? Nada! Nadinha!

Na minha inocência fui dormir e sonhar.... De manhã, quando me levantei a minha avó tinha saído mas as outras pessoas cheias de “ salamaleques” comigo iam e vinham tanto à cozinha como aos quartos de dormir sem grande justificação. A criada velha, sentou-me nos joelhos e declarou que a minha mãe tinha tido um bébé. Imediatamente a minha imaginação viu uma cegonha enorme com uma fralda pendurada no bico e entrar pela chaminé. Claro! Estava na hora !

__ Quero dar milho à cegonha!

__ Não pode ser. Já foi embora !

__ Mas ela tem que esperar por mim. Eu queria dar milho à cegonha que trouxe o bébé.

Corri estrada acima até a casa onde morava a minha mãe. Era perto. Lá estava ela, na cama, com o bébé que dormia ao lado. Corri à varanda à procura da cegonha. Nada ! E o maior dos mistérios: a barriga da minha mãe tinha desaparecido. Não relacionei os factos. Eu queria dar milho à cegonha ! Desatei numa gritaria que o meu pai deve ter acalmado com um berro. O “ cachopo” era feio... Muito vermelho e dormia. Dormia ....

O tempo foi passando na sua cadência natural. Os anos passaram com tempo e a mesma cadência.

Hoje, já velhota, passo pelas “ minhas” cegonhas e observo-as. Deambulam por cima dos campos cultivados de milho e arroz. Observo os seus ninhos lá no alto, no cimo das árvores ou nos postes. Nunca me canso de olhar. Uma ou outra passa mais perto da minha cabeça. E o pensamento surge: Onde será que vai levar o bébé que traz no bico pendurado numa fralda ?

Natércia Martins

2 comentários:

AntonioMN disse...

Gosto do conto e de outros anteriores.
Já pensaste em editar? Creio que terias sucesso.
Atira-te a uma editora, sem medo!

Beijos
António

Natércia Martins disse...

Segundo me disseram na ultima vez que fui ao museu, o livro irá sair para o proximo ano, se não houver enguiço.